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Uma das coisas mais divertidas na convivência com os seres da blogsfera é construir hipóteses a partir de fragmentos de informação sobre suas vidas.
Mais divertido ainda quando chegamos a encontrar as pessoas no "mundo concreto" e confirmamos (ou não) os delírios de nossa imaginação.
Outro dia construi a seguinte história a partir da união dos fractais postados e comentados ...
A garota tinha um blog de conotação erótica, elegante e bem escrito. Nitidamente uma alma feliz, que se divertia como criança postando poemas picantes.
De um momento para outro, fez algumas postagens demonstrando grande mágoa por estar sendo acusada de coisas que não eram verdadeiras. E decidiu descontinuar o blog.
Juntando pedaços, aqui e ali, imaginei uma garota russa (ou do leste europeu), que migrou com seus pais para o Brasil ainda pequena. Um pai alcoólatra e truculento e uma vida de poucos recursos resultaram numa infância infeliz e uma menina sonhadora.
Ainda jovem, encontrou o amor de sua vida.
Um homem grande e forte, carinhoso e protetor, mas lembrando a imagem do pai na limitada educação formal, gosto pela bebida e trato pouco refinado.
Casou-se tão logo completou seus 18 anos.
Os primeiros anos de casado foram deliciosos. O marido não permitiu que completasse seus estudos ou trabalhasse. Para quê ? Ele lhe dava tudo que precisava.
E ela se contentava em cuidar da casa e do marido amantíssimo, dedicando seu tempo livre à leitura. Adorava romances, principalmente de autores franceses.
O tempo foi passando e, gradativamente, a monotonia se instalou. Creio que não tiveram filhos.
Ela sentia o desejo de aventurar-se mais, de conhecer o mundo.
Mas a proteção carinhosa do marido prontamente transformou-se em controle e agressividade.
Era o pai, numa versão mais jovem e suavizada.
Vivendo uma reprise de sua infância, reencontrou a tristeza. E o que era pior: desta vez, sem a esperança de um casamento para salvá-la. Separar-se do marido ou ter um caso não eram opções plausíveis para uma moça de educação severa.
Até que, um dia, ela descobriu a internet e o mundo dos blogs.
Encantou-se.
Criou uma personagem para viver suas fantasias românticas, salpicadas do erotismo delicado dos autores franceses que tanto admirava.
A felicidade reinstalou-se.
O marido gostou de início, mas a pulga caminhava lentamente para alojar-se atrás de sua orelha.
Computadores e internet não eram o seu mundo. E nossa menina tomava o cuidado de só viver seu personagem e fazer as postagens em seu blog quando ele não estava em casa.
Tudo ia bem, até que um dia ela resolveu dividir seu segredo com a única amiga, esposa do amigo do marido.
Não demorou muito para que a história chegasse até os ouvidos do cujo dito, encontrando a pulga.
A casa caiu, e todos os adjetivos chulos relativos à devassidão foram bradados aos quatro cômodos.
Foi quando nossa heroína fez suas últimas postagens.
Despedi-me dela em seu blog, não sem antes encorajá-la a buscar alternativas para seguir com seu pequeno espaço de sonhos.
Algumas semanas depois ela voltou a postar, renovada. O blog, fechado apenas para convidados, dos quais tenho a honra de fazer parte.
Como ela conseguiu, eu não sei ...
Alias, nem sei se essa história é verdadeira.
Mas pelo menos teve um final feliz.