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segunda-feira, maio 07, 2007

Os Ovos do Dragão



Parte 5 – O Anel

Barceló não estava em casa quando Isabela retornou do mercado no final da tarde.
No seu quarto, sobre a cama, ela encontrou um vestido branco de renda fina e um bilhete.
Colocou o vestido sobre o corpo e olhou-se no espelho.
O modelo era diferente de tudo o que ela já havia visto. Sem alças, acinturado como um corpete, curto e com pontas agudas.
- Um vestido de fadas – pensou, entre curiosa e encantada, admirando-se.
Ainda segurando o vestido com a mão esquerda, Isabela alcançou o bilhete:
“Querida Isabela. Por favor, use esse vestido à noite. Não chegarei para o jantar. Nos encontramos às 10 horas, na biblioteca. Barceló.”
Um pedido estranho, ela pensou. Barceló não costumava se importar com trajes. Ela mesma havia decidido usar um uniforme no trabalho, porque sentia que era mais elegante e profissional, e enfrentara seu sorriso irônico nos primeiros dias.
Não era seu aniversário ou nenhuma outra data festiva, aliás, outra coisa com a qual Barceló não se preocupava.
Deu de ombros. Já estava acostumada com as esquisitices do patrão-mentor.

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Barceló chegou 21h30, vestido de negro, o que ressaltava a pele morena e o cabelo de mechas prateadas.
A camisa de mangas longas, fechada nos punhos deixava escapar o cintilar do pequeno pedantif prateado preso ao pescoço por um fio de seda preta.
Evitando encontrar-se com Isabela, dirigiu-se imediatamente para a biblioteca, em completo silêncio.
- Preciso preparar o ambiente ... detalhes são fundamentais nesse momento ... – disse para si.

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Isabela consultou uma última vez o espelho antes de descer para a biblioteca.
A ansiedade e o brilho de curiosidade no olhar a faziam ainda mais bonita.
Sentia que, por alguma razão, aquele encontro seria importante.
Talvez por isso o impulso inesperado de se maquiar.
Uma maquiagem leve, sutil, mas rara, em se tratando de Isabela.
A sombra café cintilante, suavemente espalhada, dava misteriosa profundidade aos olhos cor de mel e equilibrava o vinho do batom. O rosto pálido, emoldurado pelos cabelos castanhos, era de uma elegância clássica.
Sorriu com aprovação, segura de si.
Fez meia volta, apagou a luz e deixou o quarto.

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- Entre, e feche a porta, Isabela.
O tom de voz de Barceló, grave e imperativo, despertou-a da imobilidade.
Isabel abrira a porta e surpreendera-se com a visão da biblioteca tão conhecida, transformada em algo que ela não sabia descrever.
As luzes estavam apagadas e o ambiente iluminado por dezenas de pequenas velas brancas estrategicamente distribuídas pelo aposento, em posições e alturas diferentes, cintilando como estrelas num céu de inverno.
No centro da sala, um tapete vermelho ricamente desenhado com fios dourados estendia-se até uma exótica mesa de madeira escura sobre a qual repousava um castiçal com 7 velas longas de parafina envelhecida, cuja base estava apoiada em uma grande caixa de marfim entalhado.
Ao lado deste altar, estava um Barceló que ela nunca havia visto, mas com o qual já havia sonhado. Lindo e misterioso, rejuvenescido pela força mística que sua presença irradiava envolto numa aura alimentada pelo brilho das velas.
Isabel obedeceu. Fechou a porta e deu dois passos na direção de Barceló, insegura.
A música celta que Isabela ainda não havia percebido fazia seu trabalho subliminar.
- Venha até mim, pequena Isabel ...
Isabela cobriu a distância que a separava de Barceló como deslizasse sobre o chão, e colocou suas mãos sobre as dele, que esperava de palmas abertas.
Parecia que as chamas de todas as pequenas velas brancas estavam refletidas simultaneamente nos olhos negros de Barceló.
A energia vital que transbordava pelo olhar, fluía por suas mãos e subia pelos braços de uma Isabela sensualmente entorpecida.
Não era tesão. Transcendia a sexualidade. Era o encontro da Mulher Isabela com o Homem Barceló, e ela sentiu que sua energia também fluía para ele.
A imagem de Barceló deitado sobre ela, olhos fixos no seus durante um orgasmo simultâneo passou fugazmente por sua mente.
Sentiu seu corpo tremer, o despertar de seus seios, o arrepio de cada pequeno espaço de sua pele e o calor úmido entumescendo o monte de vênus,
Os lábios se entreabriram, as pupilas dilataram e ela sentiu que seus pés não tocavam mais o chão.
Tudo fazia sentido e nada mais importava.
A voz de Barceló parecia vir de outro mundo.
Escutava suas palavras, compreendia seu significado, mas não as capturava.
Era uma conversa entre ânimas.
Isabela não saberia dizer quanto tempo durou.
A música estava mais intensa, as luzes das velas rodopiavam, o coração pulsava rápido e ela experimentava uma liberdade e felicidade que nunca havia sentido.
Em transe, viu Barceló sorrir, soltar suas mãos por um momento e retirar um anel da caixa de marfim.
Barceló segurou delicadamente sua mão esquerda e colocou o anel, dizendo as únicas palavras da quais se lembraria depois:
- Que a tua alma seja livre ... para sempre.
Ele se aproximou e beijou-a na boca, firme e intensamente.
Isabela deixou esse mundo.

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Barceló deixou o quarto de Isabela, que dormia o sonho encantado das fadas.
- Ela está pronta. Preciso avisar Maurice.

10 comentários:

Anônimo disse...

Flávio,

Sem palavras...

"Que a tua alma seja livre ... para sempre"

Anônimo disse...

Total e completamente mágico,sensorial e encantador.

Anne M. Moor disse...

Um momento mágico, embora kind of one sided não???

Anônimo disse...

Flávio:
Harmonica e cabalisticamente revelador.
A infinita busca da perfeiçao,
se revelando em detalhes...

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Bjao

Anne M. Moor disse...

O que será que estão maquinando pra tadinha da Isabel????
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Anônimo disse...

A Isabel é ingênua? Tenho a impressão de haver qualquer coisa da literatura do início do século XX. Espero a continuação- Abraços-Zuleica.

Amanda Magalhães Rodrigues Arthur disse...

Maurice, ela está pronta!!!
Vamos, Maurice, vamos!
Nos diga o que irá acontecer com Isabel...

Ernesto Dias Jr. disse...

The plot tickens, como diria a Anne...
Vou refugiar-me e meditar por algumas horas nas ruínas do castelo Heildenberg, em busca de inspiração.

Flavio Ferrari disse...

Fico feliz que tenham gostado.
Dificil condensar a cena no espaço de um blog.
Anne: qual lado ?
Barceló é um homem cumprindo uma missão. Isabel (que não é ingênua Dona Zuleica), liberta-se mulher.
O maior prazer de cada sexo. Apenas não descrevi o que se passava pela mente de Barceló. Não cabia. Suas angústias ficam para um próximo cápítulo.

Luisa Fernanda disse...

Bueno aqui el negocio como veo es así, Barceló es simplemete un delicado perverso derivado del Diario de un Seductor de Sören Kierkegaard. Quiero ver que hacen con un Hada de tamaño natural, si ya de por si las chiquitas son infames......